Houve um tempo em que a religião era a religião da terra, da
natureza com seus ciclos e verdades inexoráveis, das quais não se podia fugir
ou mesmo contestar. Era a religião do matriarcado, do Feminino Universal, da
Grande Deusa, a religião lunar. Esta religião tinha por marca a fé, o amor, a complacência
e sua manifestação na forma de diversos cultos distintos, mas complementares. Então
havia o deus das montanhas, o deus das matas, dos mares, das cachoeiras, da
chuva, do deserto, do fogo, etc. Um deus não era maior nem melhor do que outro,
todos convivam em harmonia, circunscritos a suas regiões de adoração. Foi a
época do politeísmo. As religiões politeístas (os elementos divinos são personificados
com qualidades humanas - o que era antes apenas a Água, um ser de essência
espiritual metafísica e sagrada, agora passa a ser representada por uma
entidade antropomórfica ou zoomórfica relacionada a água), como a grega, a
egípcia, a nórdica e a asteca tiveram suas raízes nas religiões panteístas (acredita-se
num grande "Deus-Natureza" - todos os elementos naturais são
divinizados, se atribuí "inteligências" espirituais ao vento, a água,
fogo, populações animais e etc.) mais antigas e primitivas como o xamanismo, o
druidismo e as religiões africanas de raiz.
Então, os humanos conceberam a religião das estrelas, a religião
da luz solar. Era a religião do patriarcado, do Masculino Universal, do Grande
Deus. A religião solar pressupunha apresentar a luz da verdade que iluminava a
tudo e a todos, reduzindo a cinzas os medos, os equívocos, as mentiras, os
enganos e as dúvidas. Era a religião da verdade e do conhecimento, então era a
religião da ciência. Esta religião tinha por marca um único deus maior,
superior, mais potente e mais verdadeiro do que qualquer outro. Era uma
religião marcada pela hierarquia, pelo poder centralizado, pela ordem e pela
disciplina. A humanidade não estava preparada para compreender a religião
estelar e a concebeu dentro dos moldes lunares, como fé (e não ciência) fragmentada
(e não unificada) e grupos humanos abraçaram religiões solares patriarcais distintas
e se começou a não só perseguir os chamados “deuses menores” do politeísmo como
também os outros “supostos” deuses únicos adversários. Surgiram diversos “deuses
únicos”, como se isso fosse possível.
Este deus único era a fonte de amor e de unificação, mas
apesar disso, com todo este rigor a intolerância religiosa se tornou uma de
suas consequências e resultados. Da arrogante intolerância surgiu a perseguição
religiosa cega e então os crimes em nome de deuses de amor e as guerras entre
religiões que supostamente pregavam a harmonia e a paz. O primeiro exemplo
histórico deste embate se deu no Antigo Egito no encontro entre o politeísmo dos
sacerdotes de Tebas com o monoteísmo proposto por Akenaton.
A própria forma de nos relacionarmos com seres, forças ou
consciências espirituais na forma de religião já é um equívoco por si mesmo. A religião
em si é uma forma imatura de se conceber e se relacionar com a espiritualidade,
seja ela da Terra, seja ela estelar.
Religiões têm narrativas, símbolos, tradições e histórias
sagradas que se destinam a dar sentido coletivo e público à vida ou explicar a
sua origem e do universo. Das religiões derivam a moralidade, a ética, as leis
religiosas ou um estilo de vida preferido de suas ideias sobre o cosmos e a
natureza humana. Ela pressupõe o costume de se venerar ou adorar uma divindade
em especial. Religião é uma fé, uma devoção a tudo que é considerado sagrado. É
um culto que aproxima o homem das entidades a quem são atribuídos poderes
sobrenaturais. Porém, religião é também um conjunto de princípios, crenças e
práticas de doutrinas religiosas, baseadas em livros sagrados, que unem seus
seguidores numa mesma comunidade moral. Entende-se por doutrina uma forma
específica de se conceber ou abordar ou mesmo interpretar um conhecimento, uma
sabedoria, uma verdade. Ou seja, a doutrina é algo fragmentado, limitado, personalizado
e imperfeito. Uma doutrina é algo muito pequeno para se querer conter uma
verdade transcendental e aí é que reside o equívoco da religião, seja ela
politeísta ou monoteísta. Pior ainda é que da doutrina advém o dogma, “verdade”
definida “por convenção” de supostos doutores doutrinários que não podem ser
questionadas em hipótese alguma, pois sobre estes dogmas a religião se sustenta
e sem os mesmos ela desmorona.
Ora, se uma verdade espiritual é infinita e ilimitada e não
pode ser contida em uma doutrina, muito menos é possível reduzi-la a um dogma,
seja ele qual for. Uma verdade espiritual tem por característica a libertação e
jamais a escravidão, o infinito, jamais a limitação do finito. A moral que deriva
da religião é algo natural do tempo e do espaço e não tem natureza espiritual
(eterna e imutável), ela é definida por quem detém o poder hegemônico e que
codifica a seu interesse o que é “moda” ou prevalece dos costumes socialmente
aceitos pela maioria em uma sociedade. Se esta sociedade é inconsciente
espiritualmente e comete crimes em nome de seu deus, então estes crimes, por
exemplo, são moralmente não só aceitos e tidos como corretos, como também
estimulados e valorizados. Ora, nem as religiões politeístas ou as monoteístas
em suas origens aprovam ou estimulam o assassinato, o crime, o desrespeito à
vida e à liberdade em todas as sus formas de expressão.
Assim, a humanidade estabeleceu o conflito entre o Feminino
Universal e o Masculino Universal, entre a espiritualidade da Terra e a
espiritualidade Estelar, entre o sentimento e o conhecimento, entre o
hemisfério direito e o hemisfério esquerdo de nosso cérebro.
Nossa humanidade encontra-se divorciada da verdade, seja ela
feminina, seja ela masculina, seja ela em termos de sentimento, seja em termos
de conhecimento. A verdade, que resulta do encontro harmônico entre sentimento
e conhecimento, entre feminino e masculino, entre fé e ciência, entre masculino
e feminino está distante da prática moral de nossa sociedade, principalmente da
prática religiosa ou científica que deveriam promove-la. Nossa humanidade se
encontra em uma situação de esquizofrenia (perda do contato com a realidade em
toda a sua plenitude - dificuldade na distinção entre as experiências reais e
imaginárias).
Os lugares do amor e da harmonia, que são marcas centrais
tanto do politeísmo quanto do monoteísmo são usurpados pelo egoísmo, pela
inconsciência e pelo interesse humano em uma infindável disputa sangrenta e
insensível por se provar quem está certo sobre quem está errado, qual deus é
mais ou melhor. O que deveria ser motivo de união, evolução e harmonia os
humanos da Terra usam para disseminar exatamente o contrário.
É chegado o momento para se perceber isso, para perdermos
nossa incoerência, para despertarmos para a verdade verdadeira, que não está em
nada e em ninguém em particular, mas sim que está em tudo e em todos. Mais ainda,
está na hora de compreendermos que a verdade só resulta da união de tudo e de
todos, da integração dos fragmentos que atuam de forma sistêmica, em conjunto,
em harmonia, seguindo uma sinfonia divina.
Nossas atuais religiões e ciências são acordes dissonantes
nesta imensa orquestra que é a Criação. Precisamos unir, respeitando as
características individuais, o Masculino e o Feminino Universais, a fé e a
ciência, o sentimento e o conhecimento, as cores da luz prismada e as sombras
projetadas, a Deusa Natureza e o Deus Intangível. É hora de iluminarmos nossas
consciências com a luz da espiritualidade e dirigir nossas personalidades no
convívio social comum e corriqueiro, em cada ação, por mais simples que seja.
Juarez de Fausto Prestupa
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