Na Criação não existe nada perfeito ou completo. Pelo
contrário, tudo é complexo, como já vimos em artigo anterior (sobre o número
três). Desta forma, um bom doce sempre leva em sua fórmula uma pitada de sal;
todo homem tem um pouco de hormônio feminino e toda mulher tem também hormônio
masculino. Se a vida fosse somente de luz ou de trevas, nada seria visível. É
exatamente o jogo de sombras, com mais ou menos luz, que torna a visão possível
e a distinção entre uma coisa e outra. A dualidade sempre resulta e se
equilibra no terceiro fator.
O mesmo ocorre com os conceitos de “vício” e “virtude”. O
que os distingue é a prudência, ou discernimento, que é uma verdadeira “faculdade”,
não é ciência e nem mesmo arte.
Ora, o que é o vício? O vício é o excesso ou a carência do
bom. Ou seja, o pecado guarda em si uma relação e dependência direta da
virtude. Quem nos ensinou isso foi Aristóteles.
Tomemos, por exemplo, a coragem: a carência da coragem torna
a pessoa covarde, omissa e desprovida de personalidade. Por outro lado, o
excesso de coragem é imprudência, temeridade e imprudência ao extremo.
Para Aristóteles, o discernimento é uma virtude intelectual
por estar relacionado à verdade e à razão. Estudando-se os conceitos tanto de
Aristóteles quanto de São Tomás de Aquino percebe-se que o discernimento visa à
verdade da vida, enquanto que a ciência visa à verdade teórica e a arte visa à
verdade da obra.
A prudência é a ponte que une e harmoniza os contrários em
nós. Ela não tem fórmula fixa, regra ou norma objetiva.
Conforme Aristóteles, a virtude se encontra não no meio
exato da distância entre os extremos de vício (de excesso ou de deficiência),
mas sim no “justo meio”. Este “justo meio” pode se encontrar, segundo o
filósofo, próximo de uma ou de outra extremidade.
"Os vícios entram na
composição da virtude assim como os venenos entram na composição dos
remédios. A prudência mistura-os e atenua-os, e deles se serve utilmente
conta os males da vida."
François,
Duque de La Rochefoucauld
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Ou seja, a virtude e o vício são os dois lados de uma mesma
moeda. Por isso é necessário que nos conheçamos em detalhes, para não só
perceber estes extremos em nós mesmos, como para conhecê-los e equilibrá-los
com prudência, sabedoria, maturidade.
O conceito de prudência para Aristóteles e São Tomás de
Aquino é de “tomar a decisão certa para o momento (e circunstância)”. Esta é
também chamada de “sabedoria prática” (phrónesis),
diferente da sabedoria teórica (sophia).
O leitor poderá encontrar a definição aristotélica de
“prudência” (phrónesis) no Livro VI, capítulo V, da obra “Ética a Nicômaco”
(1140 a24 até 1140 b31).
Para Aristóteles o homem prudente (phrónimos) é aquele capaz de deliberar e julgar de um modo
conveniente sobre as coisas que podem contribuir para sua felicidade em geral e
não sobre questões particulares e pontuais.
Semelhantemente encontramos nos ensinamentos esotéricos que
a virtude se encontra na harmonia entre os contrários, no equilíbrio dinâmico
dos aparentemente opostos. Estes mesmos ensinamentos também ressaltam a
supremacia do pensamento e inteligência sobre as emoções e instintos.
A pessoa que age ou reage unicamente baseado em suas emoções
e instintos se assemelha aos animais e distancia-se de sua humanidade. O mesmo
ocorre quando suas decisões consideram apenas questões particulares, pontuais e
transitórias em detrimento de repercussões coletivas, futuras e duradouras.
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